A visita lava a louça e pronto

Marin Matos

12/12/2023

Sabe aquele destino que todo mundo ama mas não aguenta mais porque está lotado de gente e caro até para turistas? Imagina para a comunidade local. 

A falta de cumprimento de leis socioambientais e a disparidade econômica entre os moradores locais e o custo de vida impactado pela gentrificação, faz com que cada vez mais pessoas fujam das cidades mais amadas do mundo porque "ah, perdeu a graça".

O filósofo Byung-Chul Han, disse que: “hoje prevalece a comunicação sem comunidade. Cada vez celebramos menos festas comunitárias. Cada um celebra somente a si mesmo.”  E quando se trata de turismo, o ditado "o cliente tem sempre razão" é uma faca de dois gumes. Afinal, se o turista está pagando, será que o dinheiro não paga nada além da realização absoluta de seus próprios desejos?

Taxas de preservação ambiental, como os R$92,89 por dia em Fernando de Noronha, são necessárias e alertam contra os riscos constantes à preservação econômica, social e cultural das cidades.

O mantra para 2024 é: "a visita lava a louça e pronto". Porque muito mais legal do que o turismo impessoal é praticar o turismo consciente e solidário, onde uma viagem é uma celebração de encontros e trocas, e o último a sair apaga as luzes.

Separamos 4 destinos para você ficar de olho e pensar direitinho se quer mesmo incluir no seu roteiro de viagem. 

  1. Lisboa

Lisboa é oficialmente a cidade com os aluguéis mais caros da Europa em 2023, sendo o reflexo uma grave crise de habitação. Milhares de imigrantes do Brasil que chegam à cidade em busca de trabalho, esbarram nos preços astronômicos e acabam em situação de vulnerabilidade.

Os movimentos ”Casa para Viver” e ”Vida Justa” reconhecem que o problema de acesso à habitação como uma emergência nacional que exige soluções urgentes. Se vai a Lisboa por turismo ou imigração, prepare-se bem financeiramente porque preços razoáveis para se hospedar na cidade, achar um airbnb, hotel ou quarto tá fora de questão.

Foto: Vasco Leão @vasco_m_l
  1. Jericoacoara

Jeri é um paraíso na terra que infelizmente foi tomado pelo turismo impessoal, que viaja com um total distanciamento e indiferença quanto ao espaço que circula. Turistas que não se preocupam com seu próprio lixo, invadem os limites e regras da biosfera local, produzem poluição sonora e tratam com desrespeito às demandas da comunidade local.

A Duna do Pôr-do-Sol de Jeri corre risco de desaparecer em 10 anos, graças à soma da erosão natural e intervenções humanas, como a Vila de Jeri. O resultado é o avanço do mar, diminuição da faixa de areia e a perda de um dos pontos turísticos mais lindos do Brasil.

Foto: Miguel de Paula


A organização "Unidos por Jeri" tem cobrado do município ações de gerenciamento do lixo da região, controle de poluição sonora e a fiscalização da responsabilidade ambiental de grandes empreendimentos.

Jericoacoara doa suas belezas naturais e hospitalidades ao turismo e esbarra na impermanência sem responsabilidade afetiva. Mas se você trocar o falso luxo pelo luxo verdadeiro, que é ser um bom e educado visitante de Jeri, então vá e seja feliz!

  1. Paris

Paris, a capital do amor e do over tourism. A Ministra do Turismo da França informou que 80% dos turistas da França visitam apenas 20% do país. O resultado é uma Paris abarrotada de gente por quase todo o ano, o que ameaça o meio ambiente, a qualidade de vida local e a própria experiência dos viajantes.

O Louvre, por exemplo, colocou um limite de 30.000 visitantes por dia. Pouca coisa, né? A dica é, se você for às Olimpíadas de 2024, procure se hospedar nas cidades próximas. O Gabinete de Turismo de Paris já informou que é esperado um aumento de 314% no preço de hotéis da cidade entre 2023 e 2024.

  1. Bali

Sim, 2023 e ainda o desprazer de existir turismo de crueldade. O relatório "Férias Prejudiciais", de 2023, revelou mais de 1.300 animais selvagens em condição de exploração em Bali e sua vizinha Lombok. Os casos vão desde elefantes acorrentados, nado com golfinhos em piscinas e separação de mães e filhotes. Tudo isso através de um treinamento cruel para o turismo de entretenimento selvagem.

Macacos, em especial os orangotangos, são treinados para usar seu alto nível de inteligência para interagir com humanos, sendo tocando e passando horas tirando selfies de exploração. A crueldade do turismo selvagem segue sendo observada por organizações anti-crueldade, que cobram do governo, de agências de turismo e de hotéis, o cumprimento das leis e ações imediatas de proteção animal.

  1. Nova York

Nova Iorque ficou cara demais. Um cachorro-quente não sai por menos de 5 dólares. Um drink comum, sem uma coquetelaria especializada, não sai por menos de 12 dólares. Comer em um fast-food raramente sai por menos de 20 dólares.

Agora multiplica isso por quase cinco vezes pra converter para nosso realzinho. Somado a tudo isso, os estadunidenses tem a cultura do 'tip', as famosas gorjetas, que costumam ser de 20% para o garçom não te olhar torto.


Além disso, os AirBnBs estão com uma série de restrições na cidade, inviabilizando muito os aluguéis de curto prazo – o lobby hoteleiro venceu a última batalha, fazendo os preços atingirem as alturas.


Se você planeja ir aos Estados Unidos, que tal dar uma chance a outras cidades tão interessantes quanto, e com preço mais acessível, como Chicago ou New Orleans? Pode ser uma boa chance de conhecer os E.U.A em uma cidade mais acessível.

Foto: Udayaditya Barua / Unsplash

Aliás, nova-iorquinos passam cerca de 4 dias e 8 horas por ano no engarrafamento. Mesmo que você passe poucas horas na cidade, é certo que de alguma forma o trânsito vai te tirar a paz e afetar sua saúde, aumentando níveis estresse e doenças cardio respiratórias.

Mas não são só os turistas que andam estressados, como também a economia da cidade, que perde US$20 bilhões de dólares por ano por causa do congestionamento. A partir da primavera de 2024, a Metropolitan Transportation Authority de Nova York planeja cobrar uma taxa de congestionamento para veículos que passam pelas ruas mais movimentadas da cidade.

Se você planeja visitar a Grande Maçã, já inclua algumas despesas extras na planilha da viagem—táxis cobrarão uma taxa extra de US$1,25 por corrida e apps, como o Uber, terão um adicional de $2,50 por viagem.

Os bairros mais afetados pela poluição de tráfego urbano são Bronx, Manhattan e Queens. O M.T.A. também já está considerando US$130 milhões de dólares para iniciativas para tratamento de asma e plantas ao longo das rodovias para melhorar a qualidade de ar.

Marin Matos

Marin Matos é editor-chefe do Pronto, além de diretor de arte, designer, escritor e autor dos livros “Reinventando Marias” e “Antes do Sol Nascer”. Pessoa não-binária, nascido na Pavuna (Rio de Janeiro), vivido em Niterói, Vila Isabel e São Paulo, e atualmente estuda Cinema em Lisboa.